domingo, 13 de janeiro de 2013

Misturado: João 06:60-69

O capítulo seis de João é um capítulo bastante extenso, são 71 versículos. Começa - e se você puder olhar, deve fazer - com o relato da primeira multiplicação dos pães (o que vai do verso 01 ao verso 15). Depois passa, seguindo o texto escrito de João, do verso 16 ao 24, por Jesus andando sobre as águas e atravessando o mar da Galiléia, chegando novamente à sua cidade, Cafarnaum. Então chegamos aos versos 25 e 26 de João 06, onde Jesus começa um duro discurso sobre o que de fato significa segui-lo, servir a Deus, participar do Reino de Deus, entender e viver seus ensinamentos. A conversa ali era exatamente sobre isso, verso 28: "O que precisamos fazer para realizar as obras que Deus requer?" (Pergunta que eu não tenho dúvida, estava carregada de um certo orgulho religioso). O assunto era esse: Como é que se serve a Deus? Como é que se segue a Deus? Como se faz para viver com ele? Como é que se participa de seu Reino? "A obra de Deus é esta: crer naquele que ele enviou" (verso 29). Mas para crer em alguém que é enviado de Deus é preciso sinais. Mas o sinal já havia sido dado, era o pão, o pão que desce de Deus e dá a vida ao mundo (verso 33, você pode olhar). E aí, mais uma vez a barriga deles ronca: "Senhor, dá-nos sempre desse pão" (verso 34). Isso só confirma o que Jesus disse no verso 26: "A verdade é que vocês estão me procurando, não porque viram os sinais miraculosos, mas porque comeram os pães e ficaram satisfeitos". Comeram, estavam satisfeitos, mas queriam e iriam precisar de mais.     

Aí Jesus começa um discurso metafórico, simbólico, estranho (que muitas vezes se mistura com a ideia da ceia), mas que queria dizer e estava dizendo exatamente algo sobre o que significava servir a Deus, da realização das obras de Deus (da pergunta do verso 28), e do crer em Jesus (do verso 29), o que não significava ali, naquele momento, crer na existência dele ou em quem ele dizia ser, mas crer naquilo que ele estava fazendo e dizendo, o Reino. E o discurso começa com uma frase forte: "Eu sou o pão da vida" (verso 35). Quem come desse pão não tem fome, quem come desse pão não tem sede. E todos os outros versos que seguem serão um aprofundamento disso tudo o que está sendo dito. Os ouvintes de Jesus vão rebater o que ele está dizendo, ele vai continuar falando a mesma coisa: eu sou o pão, eu sou o pão da vida, eu sou o pão vivo, eu sou o pão que desce do céu. E a coisa segue, e segue se aprofundando, chamando para mais dentro. Até que seu discurso, provavelmente no meio de toda aquele burburinho, (mais uma vez é preciso imaginar) todos falando, se explicando, perguntando e respondendo ao mesmo tempo, se apresenta de uma forma ainda mais dura: "Eu lhes digo a verdade: Se vocês não comerem a carne do Filho do homem e não beberem o seu sangue, não terão vida em si mesmos" (verso 53). Mais (verso 56): "Todo aquele que come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele". Não é apenas comer junto (ceia), comungar com ele, mas sim comungar a ele (metafórica e simbolicamente, mas é isso mesmo). É algo meio canibal, meio antropofágico, meio vampirismo (digo isso aproveitando que os vampiros estão em moda, novamente). Eu faço parte dele, e ele faz parte de mim. Comer da carne e beber do sangue é misturar-se ao Cristo. Isso é fazer a obra de Deus, isso é crer naquele que ele enviou, em Jesus. "Aquele que se alimenta de mim viverá por minha causa" (verso 57).

"Ao ouvirem isso, muitos dos seus discípulos disseram: "Dura é essa palavra. Quem pode suportá-la?"" Esse foi o primeiro verso que lemos, o verso 60. Ouvir Jesus era um coisa. Beneficiar-se de Jesus era uma outra coisa (a multiplicação). Acompanhar, ver, ouvir, tocar, perceber, aprender, ali, tudo isso tudo bem. Mas uma coisa que eles não estavam dispostos a fazer era se misturar de uma forma profunda com Jesus. Diz o verso 66: "Daquela hora em diante, muitos dos seus discípulos voltaram atrás e deixaram de segui-lo".   

E vocês? "Vocês também não querem ir?" Perguntou Jesus aos doze, no verso 67. A resposta do apóstolo Pedro, que parece ser a resposta de quase todos eles, dos doze, é uma resposta de quem já se envolveu demais: "Senhor, para quem iremos nós?" (verso 68). Jesus não é apenas o preenchimento da existência deles, mas é também esvaziamento dessa mesma existência. Ele esvaziou as possibilidades. Não há outros caminhos, não há outras vozes, não há outros lugares. A resposta de Pedro, se imaginarmos mais, não tem entusiasmo. Carrega um pouco de um quase desabafo. É a resposta de alguém que também entendeu a dureza das palavras de Jesus, mas cuja experiência, vida e envolvimento com ele, senhor daquelas palavras, não permite outra possibilidade, a não ser a de ficar ali. Pedro não foi porque não tinha para onde ir (nem para quem). Se tivesse um outro onde ou um outro quem, ele teria feito igual. Estaria junto com quem foi embora. Mas seus sonhos já eram outros, sua esperança já era outra, seu caminho já era outro, seus valores já eram outros, sua vida já era outra. Envolvimento em profundidade é isso. Comer a carne e beber o sangue, a metáfora usada por Jesus, começa aí. É ter ele como parte em mim, e me fazer parte ou presente nele. Misturado. Pedro, por fim confessa: "Tu tens as palavras de vida eterna. Nós cremos e sabemos que és o Santo de Deus" (versos 68-69). 

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